6h14 da madrugada e eu,
irremediavelmente, já me encontro desperto. Não teve jeito. Novamente, acordei
por volta de uma hora e seis minutos antes do meu despertador gritar para
cumprir sua função de me tirar do sono pesado.
Devagar, abro os olhos,
fechando-os logo em seguida depressa. Mais uma vez, abro-os. Fecho. Abro. E o
processo se repete até que não só meu subconsciente, mas boa parte da minha
cognição perceptiva e até mesmo alguns outros músculos corporais tenham ciência
de que desta vez o repouso não se estenderá mais. Abro os olhos.
Ainda deitado na cama, me
deparo com aquilo que é a pior parte deste processo todo: se levantar da cama.
Não, o pior de tudo não é conseguir abrir os olhos de vez ou se convencer de
que o dia começou mais cedo. A parte mais problemática é realmente a de colocar
todo o conjunto corporal para trabalhar nos esforços cooperativos de se mexer
com o objetivo final de sair daquilo que é o santuário aconchegante e
irresistível do sono. Uma das escolhas mais difíceis que alguém que acordou
cedo demais toma é a de se retirar da cama. É como se durante o processo uma
parte sua ainda ficasse por lá, não importa a maneira com a qual se levante –
mais rápido ou com maior demora. Dói de qualquer forma.
Bem, enquanto pensava nisso
tudo, consegui me colocar de pé. Dou uma olhada saudosista e cheia de
arrependimento para trás, como se sussurrasse para a cama “obrigado, mas o problema não é você – sou eu” e passo a me
movimentar para fora do quarto.
Durante meu trajeto ao banheiro,
já posso escutar a algazarra do mini zoológico que dorme em casa, também já
acordado. É um miando alto e a outra mais desesperada ainda, latindo e
protestando contra a pequena barreira montada na sala que lhe serve de
dormitório.
Ainda meio sonolento, já na
sala, observo-a. Quando a bichinha da cara amassada e dos olhos saltando para
fora me vê, não se contém mais e passa a não somente protestar, mas a se
contorcer e pular e latir e choramingar em uma atuação digna do Oscar de melhor
atriz melodramática. Essa bostinha ambulante tem talento. Além de dissimulada,
é espertinha a ponto de saber usar de uma forte psicologia apelativa para
sensibilizar quem a observa. E isso que a cachorrinha tem pouco mais de três
meses – motivo pelo qual durante a noite ela tem seu espaço um tanto limitado,
para aprender a fazer suas necessidades no lugar certo. Enquanto encaro aquela
coisinha que mais parece uma mistura de um chihuahua obeso com o próprio Yoda,
me pergunto o porquê de ela ser tão esperta a ponto de, por exemplo, esconder
um comprimido embaixo da língua para cuspir depois, mas não conseguir cagar
exclusivamente em cima de seu jornal.
Dou a sala inteira de presente
para ela, enquanto escuto o gato ainda miando, do lado de fora. 6h29 da manhã e
vou fazer meu café. É disso que um sujeito que sente essa leve pontada de sono
precisa para abrir os olhos de vez e focar a atenção em alguma coisa. Bem, na
verdade, eu sei que eu preciso de uma coisinha além do café. Mas isso fica para
daqui a pouco.
Enquanto a cafeteira se põe a
trabalhar, a bichinha gordinha no chão me observa com aqueles olhos gigantes
que, de tão expressivos, parecem até irreais. Mais à frente, no limiar entre a
sala e a cozinha, aparece o gato, discreto e contemplativo, reunindo toda sua
coragem para checar o que estava acontecendo por ali. O bichano tem medo dela,
que possui 1/3 do tamanho dele. Vai entender.
Olho para o gato, e volto a
olhar para ela. O narizinho dela funga a cada respirada mais forte, devido ao
seu formato um tanto quando diferente do formato do focinho de outras raças de
cachorro. Volto a olhar para o gato, distante, e para ela, e aí olho para o meu
café. Quase pronto.
A bichinha volta sua cabeça
para trás e repara no felino ali, analisando-a. Não pensa duas vezes e com toda
a sua vitalidade corre para confrontá-lo, mexendo rápido suas patas
desajeitadas. Antes de ela pular nele, porém, o gato já saiu em disparada e já
não está mais no alcance dela. Ainda bem. O ataque brutal da ferinha poderia
ser fatal.
Enquanto me divirto com a cena desses
dois que ainda não se entrosaram amigavelmente, minha bebida fica pronta e, com
ela, me dirijo ao meu quarto.
Novamente olho para a pug mais
uma vez. Ela começa a liberar o pouco de energia que a raça tem enquanto morde,
balança e joga um dos brinquedos dela que fazem barulho. O gato, anteriormente
soberano, observa aquele ser com o qual ele tem agora que dividir espaço,
evidentemente se sentindo superior – superior inclusive em comparação com todos
os outros humanos do mundo. Não perde a pose nunca, apesar de ser mais um
medrosão do que um felino caçador.
Fechando a porta, me sento com
o café ainda quente em frente ao notebook, ligando-o. Enquanto beberico a
bebida, vou buscando pensamentos de sobre o que eu deveria escrever hoje. Essa
é a peça que me falta para meu mais completo despertar: bater os dedos nas
teclas e encher uma página em branco no Word com palavras. Essa uma hora e
pouco na qual eu acordo mais cedo me propicia realizar tal feito com relativa
maior inspiração, o que me motiva a continuar me levantando naqueles momentos
cruciais onde a coisa mais difícil do mundo é justamente se levantar.
Ainda com a xícara em mãos,
decido por algo banal, desinteressante. Apoiando a bebida na mesa, começo a
teclar, preenchendo aos poucos a folha até então em branco. “Manhã de sexta”, começo, e então a
torrente de palavras vai saindo de mim, transformando em letras e sílabas e
palavras e frases aquele resto de rotineira uma hora e pouco que me faz
despertar mais cedo dia sim dia não.
Antes que eu pudesse perceber,
o despertador toca, mas, ignorando-o, continuo escrevendo. E essa foi uma hora
e pouco das boas, afinal.
Bela sexta-feira.
Sei como é... kkk
ResponderExcluirSeu texto, Gustavo, tem leveza e um sabor familiar aconchegante. As patas e pelos em nosso entorno nos tornam, sem dúvida, muito mais humanos. Gostei. Gostei.
ResponderExcluirViu só, Jairo... kkk
ResponderExcluir--
Neiva, fico muito feliz com seu comentário. É realmente gratificante saber que minhas palavras puderam trazer boa leitura pra alguém!
Continua voltando ao Textilharia, volta e meia saem coisas novas :)