quarta-feira, 3 de setembro de 2014

O porco de argila

Eu tinha um porco de argila. Ainda tenho, na verdade. Devo tê-lo já há mais de cinco anos e venho o enchendo desde então.
Nele só entram moedas de 1 real. Essa é a condição primordial que eu estabeleci para o preenchimento do interior deste porquinho. Acredito que tal encargo seja o motivo principal pelo qual a pequena figura suína com um corte nas costas ainda exista. Afinal, não é algo lá muito comum eu chegar em casa com uma moeda de 1 real.
O pequeno porco de argila foi um presente de meu pai. Chegou despretensioso, foi conquistando seu lugar na minha mesa e hoje em dia reina soberano e pesado nela, sempre me encarando com seus olhos profundos que são verdadeiros furos sem vida no barro – mas que, surpreendentemente, conferem uma vivacidade peculiar ao cofrinho.
Hoje, o porco-cofre-de-argila já deve ter ultrapassado a barreira dos 3 quilos. Não sei ao certo, não me dou ao trabalho de pesá-lo. Somente o contemplo e admiro, pois trata-se de um sobrevivente dos anos, que resistiu e resiste bravamente ao golpe fatal do martelo.
Aí vem a pergunta óbvia: quanto será que tem ali dentro? Não sei. Não consigo fazer ideia. A quantia já me é estranha e desconhecida, completamente o oposto do porquinho de argila. Mais que um adorno à mesa, ele se tornou uma presença marcante, um mascote simbólico e especial.
Já há mais de cinco anos comigo.
O porco-cofre, apesar de estar bem pesadinho, não carrega ares de cansaço. Ao contrário: sua robustez o ajuda na fixação e sustentação das pequenas patas barrosas.
Bem. Chegará o momento do golpe de misericórdia, a pancada fatal, o fim do meu porco de argila. À medida em que ele vai ficando demasiadamente cheio, o instante de ruptura bate à porta. Pobre do porquinho. O vencedor de anos.
Se anteriormente eu ansiava por descobrir o quanto juntei financeiramente, hoje tenho lá minhas dúvidas se quero trocar isso pelo meu simpático porquinho de argila.




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