Despertou cedo e logo se encaminhou ao
seu compromisso urgente. Aquilo não poderia esperar mais. Era uma situação
dantes adiada, mas agora precisava resolvê-la de uma vez por todas.
Atendeu às exigências burocráticas requisitadas
pelo hospital e foi encaminhado ao seu local específico à espera da operação
que se sucederia. Não sentia nervosismo. Queria, porém, passar pelo
procedimento adormecido, sem precisar vivenciar a apreensão de acompanhar
desperto a cirurgia que, apesar de simples, passaria aos seus olhos e percepção
tão veloz quanto os passos de uma tartaruga.
Em sua mente, fragmentos daquilo que
conseguiu apreender durante este período ficaram marcados. Mas não eram
fragmentos relevantes, entretanto. Nada que pudesse confirmar o desenrolar da
operação em consonância com aquilo que conjecturara anteriormente.
Ao despertar em definitivo, já se
encontrava em seu quarto para sua espera.
Espera.
Teria de passar a noite ali.
Algo tão simples a princípio. Não tinha
por que ser assombrado pela interminável...
Espera.
A noite chegara.
Os barulhos nos arredores do
movimentado hospital não cessavam, só faziam aumentar. As paredes agora negras enclausuravam
em sua mente uma ideia macabra de que a noite não seria breve. Poderia se
arrastar por décadas.
Sentia as dores do pós-operatório.
Sozinho no quarto tumultuado pelos ruídos que entravam pela janela que dava
para a rua, não deixou que a apreensão e impaciência crescessem tal como as
sombras da noite ao seu redor se desenvolveram e se tornaram absolutas.
Bolou maneiras de auxiliar a solitária
empreitada a encontrar sua conclusão.
Mas todos estes planos se revelaram
verdadeiras manobras desmascaradas pela escuridão de seu dormitório, que
devorava implacavelmente, como lobos famintos em um rebanho, qualquer ilusão de
que a noite seria tranquila e breve.
Ao apagar da última luz que iluminava
parcamente o recinto, os barulhos emitidos pelos veículos lá fora pareceram
cessar repentinamente, dando espaço para macabros ruídos inexplicáveis e
imprevisíveis.
Baques secos de madeira batendo em
madeira que, somados a esporádicas pancadas produzidas pelo que pareciam portas
mal fechadas que insistiam em ir e vir na fechadura faziam um coro sinistro com
o retumbar de tambores feitos de peles de animais selvagens que martelavam sua
mente num ritmo assustador. Ele era capaz também de ouvir cada gota de soro que
pingava ali no suporte elevado, gotas que caíam pesadas e ousadas e marcavam um
movimento cadenciado que regia a trilha sonora noturna daquele lugar escuro, ao
passo que agravavam ainda mais a orquestra noturna, assombrada e sinistra que
insistia em visita-lo em angústia e desespero.
A cada mínimo som percebido, os seus
olhos ficavam mais atentos e um frio na espinha subia até a nuca. A composição
de ruídos sinistros não diminuía a individualidade mórbida de cada um, o que
poderia fazer qualquer um na situação dele se entregar às ruínas do desamparo.
Todavia, não sentia medo. Mas a escura
e amarga solidão do quarto 746 não poderia ser ignorada. Não tinha outro jeito,
porém.
Teria de esperar ali, sozinho, no denso
e penetrante negrume.
E este era o problema.
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