segunda-feira, 28 de julho de 2014

Um chamado do caçador

Sentia o frio congelante da noite fazendo seu corpo tremer. Absorvia mais do que nunca aquela atmosfera gélida de desolada escuridão fria e arrebatadora que envolvia seu ser.
Caminhando por um bosque escuro e enevoado, cheio de árvores de copas altas e troncos largos, ele não enxergava nada além de solidão. A grama sob seus pés era fria, úmida e escorregadia. Seu coração batia frenético no peito, enquanto a mente, num turbilhão de pensamentos diversos, buscava um significado para aquele momento.
Foi quando ouviu um chiado baixo.
Não sabia do que se tratava aquele incessante e agudo chiado que começava a machucar os seus tímpanos devido à frequência de emissão infernalmente ajustada para um nível tão irritante e soturno que ele não sabia se sentia mais raiva ou medo.
Sabia, pois, que não era nada humano que produzia aquele barulho que começava a soar-lhe um tanto quanto cruel.
O chiado aumentou o volume.
Começou a caminhar depressa, ainda sem direção alguma, indo cada vez mais ao coração daquele emaranhado de árvores e arbustos escuros iluminados pela luz da lua.
Com o temor que crescia no peito e aquele chiado desconhecido que certamente o perseguia, ele se sentiu em uma verdadeira caçada onde, certamente, ele era a presa.
Por um momento, chegou a acreditar que se afastava do chiado, pois o ruído lhe soou mais baixo e distante.
O coração ainda martelava freneticamente no peito quando diminuiu o passo, que até este momento já era o de um trote apressado. O barulho havia definitivamente ficado para trás, seja lá o que fosse.
Passou a olhar à sua volta com menos medo – apesar da apreensão sem fim continuar a mesma –, buscando uma ótica racional e concentrada para tentar desvendar as duas principais perguntas que lhe surgiam desesperadamente à mente: que lugar era aquele? Como ele foi parar ali?
Não se lembrava de muita coisa anteriormente. Aquela floresta sinistra e cheia de uma névoa espessa e macabra dificultava uma clareza mental mais aprumada.
Foi quando conseguia articular melhor as ideias que, de repente, começou a ouvir passos quebrando folhas e gravetos em algum ponto daquela escuridão enevoada, caminhando em sintonia com os seus próprios passos.
Parou.
Silêncio.
Receoso, com o medo retornando e não enxergando absolutamente nada que estivesse a mais de três metros de distância dele, voltou a andar, devagar. Os passos distantes – agora mais próximos – retornaram junto com sua passada cautelosa.
Estacou novamente, girando o corpo alucinada e desesperadamente para todos os lados que podia, sem, porém, conseguir nenhuma novidade no que via.
Poderia ter gritado, mas percebeu neste momento que não tinha voz nem para isso, tamanho o seu desespero. Era engolido por aquela floresta diabólica e cruel.
Em meio à sua agonia, quase pôde vislumbrar o seu perseguidor se movendo lentamente, tamanha foi a sua clara percepção do ruído de passos ameaçadores, grandes, mas que tentavam passar despercebidos que se sucedeu.
Sentindo uma agonia tão grande que parecia lhe penetrar a alma, não se segurou e se pôs a correr.
Correu como o vento esfumaçado que seguia seu corpo logo atrás.
Correu mesmo não podendo ver mais do que o espaço ligeiramente à sua frente.
Correu do medo, correu do desespero, tentou correr daquele lugar frio e horrendo.
Tinha os olhos quase fechados, mas foi obrigado a repentinamente parar de correr e abrir como nunca antes em sua vida as suas pálpebras.
Quase bateu no peito da criatura que estava parada ameaçadora e faminta à sua frente, tão abrupta fora a interrupção de sua corrida.
Pelo menos dois metros de altura, ombros largos, corpo todo cheio de pelos grossos, unhas cumpridas, pés descalços e olhos vermelhos brilhando de fúria e fome ancestrais. Foi tudo o que ele conseguiu apreender, em pânico, do vulto coberto de escuridão que se encontrava parado e aguardando à sua frente.
Ele sabia, de alguma forma, que não tinha como fugir.
Momentos antes de a criatura se mover rápida e precisa, com um golpe repleto de uma força descomunal e uma verdadeira fome de sangue, o chiado retornou, mais alto e ensurdecedor do que nunca, como que se aquele ser hediondo estivesse, no mais profundo júbilo, anunciando o sucesso do caçador.
Depois disso, para ele, era tudo a mais pura e absoluta escuridão.

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